Matéria RR online: “Casas cercam a represa Billings e causam aglomeração inadequada”



Aos 85 anos de idade, a represa Billings fica cada vez mais cercada e sufocada. O motivo: novos moradores que escolhem (ou são obrigados a) construir suas casas no entorno.
Fonte de água para cerca de 1,8 milhão de pessoas na região metropolitana de São Paulo, a Billings também é famosa por servir como área de diversão e local para prática de esportes aquáticos. É, acima de tudo, de grande importância para o equilibrio ambiental da região.
“A escolha de vir morar aqui foi pela tranquilidade e por ser uma área mais afastada, mas com fácil acesso ao centro de São Bernardo e da Via Anchieta”, diz a professora universitária Cecília de Oliveira Prado, 44, moradora do bairro Riacho Grande. Ela reco-nhece que a ocupação da área traz problemas. “Mesmo o que é ocupação legal traz problema. Principalmente por causa da falta de saneamento que em muitos lugares aqui não existe. O esgoto é jogado direto na represa. Poucas casas têm sistema de fossa”, conta.
Há quem escolha o local também pelo motivo mais óbvio: o bolso. “O aluguel aqui é mais barato. Os terrenos também. Tem muita área invadida aqui. O povo compra porque não precisa de documento, não paga imposto”, explica o contador Antonio Tadeu, 57, morador  do bairro Eldorado, em Diadema. A ajudante-geral 
Edinalva Souza Cardoso, 39, concorda. “Foi a necessidade que me fez vir morar aqui. Os terrenos são bem mais baratos. Tem bastante casa sendo construída aqui e o lixo tem piorado muito. O cheiro da água da represa está horrível.”

Uma estimativa feita pelo Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam), realizada no início deste ano, causou preocupação ao revelar que aproximadamente 20 mil imóveis estão sendo construídos nos arredores da represa.
No entanto, o local já está com capadidade máxima, com mais residências do que deveria suportar. A região que rodeia a represa é chamada de “área de manancial”. Segundo a legislação, é considerado manancial todo o corpo de água interior subterrânea, superficial, fluente, emergente ou em depósito que seja ou possa ser utilizada para abastecimento público. Regiões com essas características tem proibição ou sérias restrições quanto a fixação de construções imobiliárias no arredor. Loteamentos clandestinos afetam gravemente a infra-estrutura de saneamento por despejarem esgoto diretamente na represa e agredirem a vegetação que permeia a área. Mesmo assim o Conselho Nacional de Meio Ambiente permite e comanda a regularização de moradias estabelecidas nas chamadas APPs (Áreas de Proteção Permanente), que é o caso da represa.   
Na década de 70 uma legislação rigorosa para a proteção dos mananciais proibia a instalação de qualquer serviço de infraestrutura ao redor da Billings. No entanto, com a expansão urbana, ocupações irregulares começaram a ocorrer no entorno e, ao longo dos anos, milhares de famílias, sem condições socioeconômicas de se manterem nos centros urbanos, migraram irregularmente para as áreas protegidas. Sem abastecimento de água, coleta de lixo e tratamento de esgoto, todos os resíduos gerados pelos ocupantes  – que já chegam a 1 milhão – passaram a comprometer a qualidade das águas da represa.
As campanhas de conscientização não são poucas. Frequentemente a Billings é abordada por toda a mídia. As prefeituras das cidades banhadas – Rio Grande da Serra, Diadema, Ribeirão Pires, Santo André, São Bernardo e São Paulo – também realizam campanhas e fiscalização dos imóveis. Mas todo o esforço parace insuficiente quando comparado com os números e com a visão que se tem da área. Haverá solução para o problema social e ambiental?
Entre as campanhas mais antigas e conhecidas está a “Billings, eu te quero viva!”, criada em 1993 e adotada pelo Proam em 2003. 
“Como parte da campanha, passamos a fazer o relatório para documentar a degradação da área”, conta o presidente do Proam, Carlos Alberto. Ele se refere ao 
Relatório de Impactos Ambientais da Represa Billings, divulgado anualmente. O documento atualiza os dados sobre níveis de poluição, desmatamento, população e imóveis. A pesquisa de 2010 já aponta  um assustador aumento populacional de 100 mil pessoas – o equivalente a 10% da atual ocupação da bacia do reservatório.

“O crescimento populacional que apontamos tem como base os dados so IBGE. Além disso, fazemos uma pesquisa de campo, fotos aéreas e usamos imagens feitas por satélite. Então juntamos todos os dados fazemos um quadro comparativo”, explica Alberto. “Desde 1998 temos percebido uma crescente verticalização da ocupação das áreas. As casas, antes de 1 ou 2 andares (sobrados) tem aumentado para 3 andares e em algumas regiões até 6. Inclusive muitas são em áreas com risco de deslizamento”, alerta. Os dados completos do relatório serão divulgados em junho.
Em maio passado foi criada pelo governo do Estado a Lei de Proteção da Billings, que promete recuperação e preservação da bacia, com a meta de diminuir em 73% o nível de poluição do manancial até 2015. O ex-governador José Serra assinou no início de janeiro o decreto que regulamenta a lei. A ideia é tornar possível a regularização de imóveis e ao mesmo tempo recuperar ambientalmente a área. Ao menos 100 mil proprietários de imóveis na região serão donos de suas casas, com toda a documentação em ordem, e passarão a usufruir benefícos como acesso a crédito bancário.  Por meio de sua assessoria, Serra disse se tratar de uma regularização que pressupões planos de urbanização, esgotamento sanitário e saneamento.
Para orientar e tirar dúvidas da população sobre a regularização de imóveis na região dos mananciais, a Secretaria do Meio Ambiente montou um posto no Poupatempo de São Bernardo.
Dois meses após a regulamentação da lei, a média de atendimentos diários chegou a 55. A ideia é esclarecer e ajudar os moradores a regularizar situações incompatíveis com a lei.
Alberto  faz ressalvas. “A Lei da Bllings não traz relatórios do estado de degradação da represa. Assim, não consegue identificar o que já estava degradado e nem o que vai piorar. Sem passivo ambiental a lei não pode responsabilizar quem causa danos à represa. Os motivos que as pessoas alegam quando vão morar na região são questionáveis. Não dá pra querer morar na caixa d’água só porque ela é mais tranquila”, critica. “Quem loteia áreas de manancial ganha muito vendendo-as fatiadas por um baixo preço. Mas quem compra está sofrendo um grande  golpe.”
A praia paulista – A região é também explorada como área de entretenimento. Dos anos 40 aos 60 era, inclusive, chamada de “Mar Paulista”. Em São Bernardo a Prainha do Riacho Grande chega a receber cerca de 10 mil visitantes no verão. Já o Parque Estoril, também em São Bernardo, recebe 13,3 mil pessoas por mês. O parque é o lugar que mais oferece opções de lazer às margens da Billings. Há até um zoológico com 300 animais, sendo alguns considerados em risco de extinção. Em março deste ano foi realizada no parque a Maratona Aquática Sabesp, parte do Campeonato Paulista de Maratonas Aquáticas. A competição teve participação de atletas de todo o Grande ABC. Há também opções gastronômicas.